27 janeiro 2016

Pendurando as palavras num varal criativo


Essa semana entrei numa livraria e logo me deparei com uma criança chorando  . Como estava com pressa, não dei muita importância e  tentei me concentrar na busca por alguns livros que tinha em mente.  Anda daqui, olha acolá, e o choro ainda se fazia presente.
Não demorou muito  e como o choro continuava, repousei o livro que estava em minhas mãos, sobre o balcão lotado de bons livros e me virei para  que meus olhos pudessem encontrar  a cena  do menino que tanto chorava.
O  vi, tão pequenino, de bermuda jeans e sandálias creme e azul. Cabelo encaracolado e estava seguro pelas mãos firmes de sua mãe,  jovem, de chapéu  e também de bermuda jeans.  Seus cabelos dourados se misturavam ao belo sorriso ao presenciar o filho chorando por querer ler um livro. E como chorava! Pedia insistentemente por um livro. Ele , ainda tão criança, estava decidido ler um livro e ponto final.
Não acreditei no  que vi e fui logo perguntando sua idade. Então  soltei uma gargalhada ao saber que era tão somente  dois anos e três meses.  Me encostei no balcão e admirei a cena mais bela  que já tinha visto.
Ele escolheu o livro , na verdade, dois livros, com desenhos que ele lia com perfeição e repleto de entusiasmo.
Me lembrei do Manoel  de Barros,  que escreveu sobre o menino que carregava água na peneira.   A mãe do menino, falava sempre que carregar água na peneira era o mesmo que roubar o vento e sair correndo para ofertar aos irmãos. Que era o mesmo  que  catar espinhos na água ou criar peixes nos bolsos.  E assim, o menino sabia  que tinha que escrever e que escrever era o mesmo que carregar água na peneira. Escrevendo ele soube usar as palavras. Ele brincava com elas. Fazia peraltagens mil com elas. E brincando com as palavras , esse menino conseguiu  fazer até pedra dar flores.
Viajei por uns instantes  nesse encantamento todo de Manoel de Barros  e me voltei ao menino da livraria, que nesse  momento, já não chorava mais . Estava ocupado com a leitura do seu jeito único de ser.  Ele segurava  dois mini livros , com toda doçura e inquietude de menino que sabia muito bem  o que queria.
Ganhei o dia. Saí da livraria  com a certeza de que   devemos sonhar. Devemos  acertar o passo no compasso acertado todos os dias. Rasgarmos a alma no tudo que há de mais sublime e arriscarmos sempre para no final, acertarmos de maneira gloriosa. Saber brincar com as palavras deve ser missão honrosa dos que não tem medo algum de palpitar idéias mil , na plenitude da imaginação sem fim.
De agora em diante o que vale  é  pendurar todos os nossos sonhos num varal  cheio de encantos e poesia.
Bora lá pra mais um passo acertado, pois afinal, estamos aqui de passagem e que essa passagem seja  por caminhos de  arte e poesia.